segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Juros têm é de baixar, e até o FMI o percebeu

O noticiário sobre o empréstimo de US$ 10 bilhões ao FMI, que domina o noticiário econômico de hoje, tem vários pontos a serem observados, muito interessantes para quem quer formar uma idéia sólida sobre os desafios da economia brasileira e o papel de nosso país no mundo. Pela primeira vez, 0 Brasil sai da posição de devedor para a de credor no Fundo, e o faz dentro de um contexto de mudança da estrutura de poder na entidade, que só pôde acontecer com o baque que as economias mais desenvolvidas sofreram com a crise, mesmo que o esvaziamento do FMI date de bem antes.

paulo_nogueiraContra a vontade dos países europeus, mas com o discreto apoio dos EUA - que é o mais combalido pela crise - operou-se uma transferência de cotas dos países centrais, como explica o economista Paulo Nogueira Batista Jr, diretor brasileiro do organismo:

“As cotas são o principal determinante do poder de voto na instituição. Ficou estabelecido que na próxima revisão geral de cotas, a ser concluída até janeiro de 2011, haverá transferência de pelo menos 5 pontos percentuais para os países dinâmicos de mercado emergente e em desenvolvimento. Atualmente, os países desenvolvidos têm 60% das cotas e os países em desenvolvimento, 40%. A participação dos emergentes e em desenvolvimento no total das cotas aumentou apenas 5 pontos percentuais nos últimos 30 anos. Para a próxima revisão, foi fixado um piso para a transferência, 5 pontos, mas não um teto. Os Bric (Brasil, Russia, India e China) vão continuar lutando por uma transferência maior, da ordem de 7 pontos.”

Sobre isso, é importante entender que este “empréstimo” ao FMI não sai do Orçamento público, nem do Tesouro Nacional. Vem do “colchão” de dólares das reservas cambiais brasileiros e não ficam imobilizados lá no FMI, mas convertem-se em “Direitos Especiais de Saque”. E nossas reservas estão muito altas, precisam ser aplicadas e o mundo está pagando muito baixo por dinheiro disponível.

Entra aí o outro lado da moeda: porque é que estamos com tantos dólares disponíveis? Porque, como eu postei outro dia aqui, a entrada de capitais no Brasil tem se acelerado muito. A entrada de capital produtivo e o saldo comercial já são menores que a entrada de capital especulativo. Ele vem para o Brasil atraído pelos juros elevados que o BC fixa - e os quais o sr. Meirelles deseja aumentar mais, de novo.

Parte do dinheiro barato injetado pelos bancos centrais dos países desenvolvidos está se desviando atualmente a mercados emergentes, especialmente o nosso. onde encontra mais rentabilidade, o que provocou uma alta extraordinária na Bolsa , diretamente e através de fundos. Mas também na renda fixa, onde as operações são lastreadas na taxa do BC.

O problema é que isso gera um endividamento interno crescente - embora, com a queda das taxas, os juros e os serviços desta dívida tenham se reduzido um pouco. E, para pagá-lo, o país tem que produzir superávits que retiram dinheiro do Tesouro.

Existe uma consciência quase unânime de que não podemos seguir com o câmbio depreciado demais e com esta entrada irracional de moeda. Até mesmo os dirigentes do FMI - insuspeitos, portanto, de qualquer “desvio” nacionalista ou esquerdista - o dizem. O diretor do departamento das Américas do FMI, Nicolás Eyzaguirre, diz que “O Brasil vai aumentar o apetite dos mercados de capitais, dada a solidez de sua economia”.

Eles acertam no diagnóstico, mas erram no remédio. Querem que se freie a economia. E o Brasil quer que se baixem os juros. Felizmente, já há outras visões menos ortodoxas, hoje, no FMI, como a do diretor brasileiro. Nogueira Batista Jr, com a diplomacia necessária a quem ocupa seu posto, disse bem claramente, na entregista que concedeu há dois meses ao blog da jornalista Estela Benetti:

O Brasil já não é mais o campeão mundial de juros, mas a taxa de juros brasileira continua alta em termos reais. Acho que há espaço para reduzir mais os juros este ano. É claro que a preocupação com a inflação tem que existir, mas com a economia saindo de uma recessão de maneira lenta, é normal que o governo use a política fiscal e monetária como instrumento antirrecessivo. Acredito que ainda há espaço para redução dos juros, não só a taxa básica, mas as taxas do sistema bancário, que são muito altas.

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